"Escrever faz-me voar nas asas do coração, mergulhar num mar de paixão e padecer numa tempestade de amor"
quarta-feira, 27 de outubro de 2010
Coimbra Estudantil e Fadista
segunda-feira, 25 de outubro de 2010
Orpheu
sábado, 9 de outubro de 2010
Tempo Imparável
segunda-feira, 4 de outubro de 2010
Tempestade
Lá fora o vento sopra forte levando minha emoções e ilusões para bem longe. Bendito vento que me levou o sofrimento. Maldito vento porque me levou esse amor, meu sustento. Agora falta vir a chuva para apagar toda a dor que ainda ficou e o Sol para queimar o que de amor sobrou e finalmente a neve para cobrir o meu coração e o encerre, para sempre.
sexta-feira, 1 de outubro de 2010
Felicidade Amarga
Num pequeno banco de jardim rodeado de cheirosas e coloridas flores estava sentado Luís. Homem por volta dos 34 anos, de meia altura, forte fisicamente, vestindo uma camisa mal arranjada e umas calças de ganga algo amarrotadas, olhar castanho-escuro, nariz nem muito curto nem muito longo, uma expressão facial toda ela a denotar tristeza. Momentos como este quem os não tem? Pensativamente, Luís tentava encontrar um rumo para a sua vida, tentava ter a sua auto-estima de volta, procurava um lugar onde pudesse ser feliz. Alguém numa cadeira de rodas pára a olhar para ele. Este novo homem tem uma expressão pensativa mas alegre, brilham-lhe os olhos azuis na cara, um cabelo negro curto, da altura dá para ver que é alto mas magro e veste uma camisola verde vivo que lhe assenta muito bem e para completar umas calças de ganga em tudo idênticas às de Luís mas engomadas. A sua idade deve rondar os quarenta anos. O seu nome é Salvador e, apesar de ter todas as razões para se sentir infeliz, é um homem com uma felicidade e um sorriso contagiante.
- Então que cara é essa amigo? – inquire o recém-chegado Salvador.
- Cara de quem vê a vida a dar para o torto – responde Luís desanimadamente não erguendo os olhos para quem o inquire.
- Que desespero é esse? – retorna Salvador.
- Tudo o que tinha foi-se.
- Tudo?
- Sim, para mim era tudo.
- Conte-me lá essa história. Eu posso ouvi-lo.
- Talvez seja melhor sentar-se.
- Mas eu já estou sentado – responde Salvador sorrindo e esperando que o outro erga o olhar.
Luís faz isso mesmo e fica surpreendido.
- Peço desculpa, não quis ofende-lo.
- Não é isso que me ofende. Acredite que se me tivesse ofendido já não estaria aqui para o ouvir.
- Você parece-me um bom homem.
- Faço por isso – afirma Salvador com grande boa disposição.
Por momentos, o silêncio instala-se. Contudo, Salvador consegue puxar novamente a conversa anterior ao pedido de desculpas e Luís começa a contar a sua história.
- Bom, tudo começou há quatro anos atrás. Conheci uma rapariga, a Carla. Não posso dizer que tenha sido amor á primeira vista mas foi quase. Ela era tão bonita, tão cheia de energia e atraia-me de um modo estranho. A nossa relação desenvolveu-se de uma forma ainda algo incógnita para mim até que começámos a namorar faz hoje precisamente três anos. Foi aqui que aconteceu o nosso primeiro beijo.
- É um local marcante este então.
Luís continuou não ligando à interrupção.
- Casámos e vivemos felizes durante alguns meses. Depois os problemas de dinheiro, o chegar tarde a casa, discussões começaram a minar a nossa relação. Parecia impossível que isso acontecesse. A cada dia eu sentia que perdia um pouco dela e não sabia o que fazer. Ainda hoje não sei o que poderia ter feito. Entrámos numa espiral de monotonia, a cama era apenas utilizada para dormir e as noites foram-se tornando cada vez mais longas. Apesar da proximidade que tínhamos nessa cama de casal, havia um mundo a separar-nos. Era uma distância abissal que nada conseguia preencher. Tentei resolver com convites para sair. No entanto, quando nos sentávamos parecia que havia um lugar entre nós preenchido por um monstruoso vazio. A relação foi-se deteriorando sem que os meus esforços fossem recompensados. Sentia da parte dela algum conformismo com a situação, parecia querer aguardar com naturalidade por melhores dias. A tristeza foi-se apoderando de mim e deixei de tentar. Começámos a viver na mesma casa como se fôssemos estranhos. Já não reconhecia o perfume que ela deixava no ar, não abria a boca com medo de iniciar um monólogo que nos afastaria ainda mais. Vivemos nisto até há bem pouco tempo. Ela fartou-se e foi viver com outro homem que já tinha durante o nosso casamento. Pediu o divórcio e apagou os anos ao meu lado da vida dela.
- E a tristeza é só por isso? – questiona Salvador.
- Acha pouco? – interroga Luís surpreendido com a atitude daquele homem de cadeira de rodas.
- Vou-lhe então contar eu a minha história.
- Força.
- Eu nasci normal como grande parte das pessoas. Aprendi a falar e a caminhar. Cresci, entrei para a escola e até aqui tudo bem. Quando cheguei os meus vinte anos, andava na universidade, apaixonei-me por uma rapariga fantástica. Nunca me esquecerei da Amélia. Tinha um olhar verde tão doce e uns lábios aveludados e vermelhos. Era um sonho. Namorámos durante vários meses. Um dia, os meus pais vieram buscar-me à universidade para irmos á terra dos meus avós maternos. Tivemos um grave acidente. A minha mãe morreu e eu fiquei assim. Foi horrível. Soube que ia ficar assim para sempre. Os médicos nunca me pouparam nem me deram esperança. O meu pai quando soube que eu ia ficar assim fugiu sem pensar em mais nada. Fiquei com os meus avós durante algum tempo. Telefonei a Amélia dizendo-lhe que tinha tido um acidente mas escondi-lhe o facto de estar numa cadeira de rodas. Disse-lhe que ficaria a recuperar juntos dos meus avós e não a poderia ver durante um tempo. Ela insistiu em vir-me visitar mas eu convencia a não o fazer pois iria custar-me imenso uma despedida. Consegui esconder isso durante dois meses. Um dia telefonei a Amélia disposto a contar-lhe tudo. Ia-me faltando a coragem mas disse-lho. A resposta dela foi “porquê só agora, Luís?” e eu respondi timidamente “tinha medo que não gostasses mais de mim por eu estar assim”. Ela respondeu calmamente “isso não muda nada do que és”. Passados alguns dias após esta conversa, regressei à universidade e foi uma experiência inenarrável. Os olhares de pena matavam-me. Não suportava que me olhassem como se eu estivesse morto para a vida. Amélia veio ter comigo e beijou-me tão apaixonadamente como nunca o havia feito. A situação manteve-se por algumas semanas. Amélia todos os dias era assediada por outros rapazes que diziam que eu já não era homem para ela. Ela tentava esconder-me isso mas eu apercebia-me dessas situações. Depois pensei “que futuro terá esta rapariga? Viver com um aleijado para o resto da vida”. Tomei a decisão mais difícil da minha existência. Acabei a minha relação com a minha Amélia. O meu coração partiu-se em pequenos pedaços. Mas, no fundo, eu sabia que tinha tomado a decisão correcta. Não podia prender Amélia a mim nem a esta cadeira. Seria uma vida demasiado dura para ela. Doeu-me vê-la olhar para mim com lágrimas nos olhos como que implorando para voltarmos a ser um casal feliz. Quase cedi. Algumas semanas mais tarde estava preparado para ceder mas era tarde demais. Ela já namorava com outro rapaz. Senti-me a pior pessoa do mundo. Em pouco meses tinha perdido a minha mãe, o meu pai abandonou-me e expulsei da minha vida a única mulher que alguma vez amei. Padeci pelas minhas decisões erradas. Desde que a Amélia me deixou mais nenhuma mulher olhou para mim com olhar apaixonado. Só vejo olhares de pena, olhares de quem tenta imaginar mas não sabe como é estar preso a esta maldita cadeira. Ainda assim, prossegui a minha vida, formei-me em História e vou dando aulas. Os meus alunos estranham a alegria que mantenho todos os dias. Eu apenas digo: “Temos que ser felizes todos os dias. Temos de agradecer por poder acordar e ver o sol mais uma manhã. E eu tenho de agradecer por não ter morrido naquele acidente pois ainda tenho muito para viver e não quero esquecer os bons momentos que vivi”. Só tenho pena de duas coisas: não me poder despedir da minha mãe e de não ter Amélia a meu lado. Mas a vida continua e cada um tem de ser feliz com o que tem, eu tenho esta cadeira que se tornou no amor da minha vida. Somos inseparáveis. Não gostava muito dela até perceber que ela iria ser minha companheira para toda a vida e que tinha de gostar dela como gostava da minha Amélia. Aprendi a sorrir e a ver o lado bom da vida.
- Que história – exclamou espantado Luís.
- Pois, mas ainda não acabei.
- Continue então.
- A minha Amélia morreu. Foi o pior momento da minha vida. Mas foi antecedido pelo melhor. Amélia visitou-me e ambos pedimos perdão pelos erros do passado, eu por a ter afastado da minha vida e ela por não ter lutado mais por mim. Disse-me que estava muito doente e que não queria morrer sem que eu soubesse que ela me amava e sempre me amou. Fez-me prometer que seria feliz todos os dias da minha vida. Beijámo-nos e no calor desse beijo tão apaixonado como fora aquele depois do acidente ela soltou-se e caiu no chão. Chamei a ambulância mas eu sabia que era o fim. Mas cumpri a minha promessa e sou feliz porque amei e fui amado.
- Mas em que é que isso me ajuda?
- Eu explico: apesar de todas as tempestades temos de der felizes porque algures, no céu ou na terra, há alguém que nos ama. Amélia amava-me e eu amava-a a ela. Você amou essa mulher mas ela não o amava. Tem de continuar a procurar uma mulher que você ame e esperar que ela o ame a si. Mas enquanto procura tem de sorrir. Pode ser um sorriso de felicidade amarga como o meu mas uma pessoa com um sorriso vale mais do que duas ou três a chorar. Um sorriso conquistará muito mais gente.
Salvador com as mãos começou a fazer rodar as rodas da sua cadeira e deixou Luís a pensar naquelas palavras de esperança.