quarta-feira, 31 de julho de 2019

As Frutas e Legumes são Pesados na Caixa- Parte II

A partir de um texto de Miguel Esteves Cardoso

"O tempo não passa pela amizade. Mas a amizade passa pelo tempo.É preciso segurá-la enquanto ela há." É nefasta a brevidade do tempo que passamos juntos. Mas nada existe de melhor do que a companhia das pessoas que escolhemos amar de forma leal e incondicional. Fazemos sempre o mesmo: bebemos umas quantas cervejas (bem frescas), um café, fumamos um cigarro, vamos almoçar ou jantar... E tudo tão diferente mas sempre igual. Unidos em volta destas coisas tão banais, vivemos aquilo a que se resumirá a nossa vida. Percorremos um caminho juntos mas cada um por si. Vamos criando aquilo a que chamamos memórias. Temos tendência a guardar os bons momentos mas estamos sempre mais presentes nos maus. Deve-se isso a um compromisso que temos: nunca deixar que o amigo bata no fundo. Temos o dever de o erguer, de o fazer olhar em frente e ver tudo aquilo que ainda temos para viver juntos. Invisivelmente estamos sempre de mãos dadas tal e qual os namorados no início da paixão. A amizade, quando é verdadeira, resiste à distância, a todas as tempestades, a todos os obstáculos... E quando se ganha um amigo é para a vida, é viver aprisionado a alguém mas num aspecto positivo. "Somos amigos para sempre mas entre o dia de ficarmos amigos e o dia de morrermos vai  distância tão grande como a vida." 

segunda-feira, 29 de julho de 2019

Surpresas

Gosto de surpresas e, no entanto, odeio-as. Aquele momento em que o coração explode num sentimento tão pouco cerebral. Não existe ligação entre entre a razão e a emoção. Vê-la outra vez acelarou-me o coração e toldou-me a razão. Porque será que não consigo sentir com o cérebro? Quando a vejo apenas o coração pensa. Será isto o amor que tanto se apregoa? É mais que isso. Olhos que não vêem, coração mais descansado. Mas quando a vejo o coração sente mais que qualquer outro. Acelera mesmo tendo o motor já cansado e velho. Entra numa combustão sem fim que me leva todas as energias. E mesmo chovendo oo sol brilha. Porque para mim ela será sempre um belo dia de Verão. Contudo, quando o coração desliga, o cérebro sabe que ela é uma nuvem. E como nuvem tanto se pode desviar-se do Sol como pode fazer chover. E ela é isso e muito mais. Por isso é que eu sei que ainda a amo. Pela montanha russa de emoções que me provoca, por viver numa ambiguidade tão boa, por ser amado e rejeitado. É algo tão estranho e tão encantador. Hei-de chegar até ela. Mas o que interessa realmente não é lá chegar. É a viagem. E apesar de dolorosa vai ser uma viagem magnífica. Lá chegarei. Se o motor aguentar.

quinta-feira, 11 de julho de 2019

Biografia

A partir de um poema de Alberto Caeiro
"Se, depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia, não há nada mais simples. Tem só duas datas - a minha nascença e a da minha morte. Entre uma e outra coisa todos os dias são meus."
Dias que se acumulam e somam semanas. Semanas, meses, anos... Tanta medida para medir algo tão imensurável. Somos nós que medimos o tempo. Tanto breve instante que dura uma eternidade. Tanta eternidade que dura apenas um momento. Quanto desse tempo conseguimos guardar e aproveitar? Tão pouco que até causa raiva. Revivemos enquanto dormimos e sonhamos acordados. Tanta vida que se acumula. Não é o sonho que comanda a vida, é a vida que gera mais sonhos. E tão belo que isso é. Mas é tudo tão nosso. Claro que a partilha é, ainda, um bem precioso. Viver isolado é uma reclusão perpétua. Mas ninguém viverá a minha vida por mim. Neste limbo em que vivemos somos todos actores. E nós temos o papel principal da nossa história. Contudo, quando uma lápide de mármore nos cobrir seremos apenas duas datas. E todos os outros dias morrem connosco.